A Voz Delas
divas Foto: Reprodução

Sexy e pronto

Sei que esse texto vai gerar treta, mas acho pertinente nós – mulheres – abordamos sobre isso

Por Ana Horta

Esse texto surge a partir de uma conversa com uma amiga sobre o tema sensualidade feminina das “divas pops”. Talvez porque ela saiba que eu gosto muito da Anitta ou talvez porque eu tenha falado sobre isso no texto, publicado aqui no portal, da Miley Cyrus, no Lollapalooza.

A grande polêmica é que as mulheres de sucesso no mundo do entretenimento estariam, hoje, utilizando desse artifício sensual para conseguir o sucesso e não porque são talentosas. E quando fazem isso se rebaixam aos homens, portanto, não podem, essas pessoas acreditam, ser consideradas feministas, como muitas delas se “auto classificam”.

Origem dessa polêmica

A primeira coisa a se dizer sobre isso é que existe uma origem por trás desse entendimento, do qual é superlegítimo.

Nos anos 90 anos, o Brasil inteiro descia na boquinha da garrafa com o “É o Tchan” onde, sempre, duas mulheres – Carla Peres e Scheila Carvalho (última integrante, teve outras) – usavam shorts curtíssimos e, junto com o dançarino Jacaré, entre as duas, dançavam de forma sensual.  Comandando tudo isso, estavam Beto Jamaica e Compadre Washignton. As crianças, incluindo eu mesma, que na época tinha 12 anos, íamos a loucura com tudo isso. Dançávamos e divertíamos na mais pura inocência.  Estranho falar isso hoje, mas a época era outra. É bom frisar.

é o tchan
Foto: Divulgação

Carlas Peres, em entrevista ao antigo ‘Programa da Sabrina’, o que a fez sair da banda. “Eu era menina, muito nova e jamais iria aceitar que ninguém, muito menos homem nenhum, me agredisse. Como houve agressão gratuita eu pedi pra sair.”

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Foto: Divulgação

Nesse mesmo período, o Programa H, de Luciano Huck, estreava na Band trazendo a Tiazinha, personagem inspirada em quadrinhos, com traços sadomasoquista, que escolhia rapazes para responder perguntas e, caso eles errassem, eram depilados ou chicoteados.

Depois de um tempo, no mesmo programa, surgiu a Joana Prado, apresentada como amiga da Tiazinha, que fazia danças sensuais para os convidados.

Características dessas mulheres

Tanto no “É o Tchan” quanto no programa do Luciano Huck, as mulheres estavam sobre o comando de homens. Faziam o que eles determinavam a elas fazerem.

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Foto: Divulgação

Hoje em dia Joana Prado não gosta de falar sobre esse assunto. Suzana Alves, a Tiazinha, tão pouco. Segundo a jornalista Astrid Fontenelle, quando esteve no programa Saia Justa, a atriz solicitou que nenhuma foto dessa época fosse mostrada. O trauma nessas mulheres parecer ser realmente grande.

Algumas pessoas acreditam, inclusive, que isso também foi um dos grandes motivos que levou Luciano Huck desistir da presidência.

Mulheres atuais

Vamos pegar como exemplo as duas mulheres que utilizei no começo deste texto: Anitta e Miley Cyrus, que são – inclusive – amigas. Elas são muito sexys, mas por trás, na frente ou do lado delas não existe nenhum homem exigindo que façam o que for. Elas se posicionam da maneira que querem. De forma que seja estratégica ao seu negócio ou não.

Anitta, por exemplo, lançou a sua música “Envolver” em novembro de 2021, mas só agora – depois do clipe e uma campanha muito bem feita de MKT – é que ela estourou no mundo. Vou eu lá criticar ela por causa de um clipe sensual, do qual Madonna, há séculos, já fazia? Claro que não! Eu só aplauso e faço isso de pé!

O que está por trás das críticas?

Essa é a pergunta que me faço sempre. A resposta vem, quase sempre, de imediato e da seguinte forma: “qual é a influência que essas “divãs do pop” estão tendo sobre as crianças? A gente vê aí a quantidade de adolescentes grávidas que só aumentam”. Bom, se “contra dados não há argumentos”, vamos a eles:

Pesquisa realizada pela DATASUS/SINASC divulgada em 2021:

  • Em 2018, a participação das adolescentes entre 10 e 19 anos representou 15,5% do total de partos (nasceram 456.128 bebês filhos de mães adolescentes). Neste momento, no cenário musical do Brasil, surgia Mc Carol, com a música “100% Feminista” e Valesca Popozuda, com hits como “Late Que eu Tô Passando”, “Beijinho no ombro”. Essas mulheres foram precursoras do empoderamento feminino na música e o resultado disso, nas adolescentes, já conseguimos ver no ano seguinte.
Foto: Divulgação
  • Em 2019, observa-se redução para 14,7% do total de partos no País (419.252 filhos de adolescentes). Neste ano, a lista das 10 músicas mais ouvidas no Brasil era de mulheres, sendo as primeiríssimas colocadas Combatchy, colaboração de Anitta, Lexa, Luísa Sonza e MC Rebeca e Supera, de Marília Mendonça.
  • Considerando que em 2000, os nascidos vivos de adolescentes representavam 23,4% do total de partos no País, a redução entre 2000 e 2019 foi de 37,2%. Neste ano explode Tati Quebra Barraco, carioca e negra, que traduz em suas letras o cotidiano da mulher que vive na periferia, e põe em discussão que a mulher não precisa ser santa para ser respeitada. Com o hit “Boladona”, Tati estoura nos bailes e agrega o público feminino para esses eventos.
tati quebra barraco
Foto: Divulgação

Mostrado os dados acima, não é preciso dizer que o argumento para justificar a crítica das musas pops é plausível. Pelo contrário, além de trazer os dados que comprovam a redução do número de grávidas adolescentes no Brasil, ao longo dos anos, é possível ver como esse dado caminha junto com o empoderamento feminino na música e quanto a arte é importante para mudar tristes cenários.

O que de fato precisamos evitar?

O que mais me entristece nesse tipo de discursão é que, na maioria das vezes, eles são feitos entre nós, mulheres, e não leva a nada. Só nos distancia uma das outras.

Enquanto isso, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública:

  • Em 2021, ocorreram um total de 1.319 feminicídios no país,
  • Em 2021, em média, uma mulher foi vítima de feminicídio a cada 7 horas;
  • O ano de 2021 marca a retomada do crescimento de registros de estupros e estupros de vulnerável contra meninas e mulheres no Brasil. Foram registrados 56.098 boletins de ocorrência de estupros, incluindo vulneráveis, apenas do gênero feminino. Isso significa dizer que, no ano passado, uma menina ou mulher foi vítima de estupro a cada 10 minutos, considerando apenas os casos que chegaram até as autoridades policiais;

Enquanto isso, segundo Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilio do IBGE:

  • As mulheres ganham 20% menos que os homens no Brasil. Mesmo tendo igual perfil de escolaridade e idade e na mesma categoria de ocupação
  • No 4º trimestre do ano passado, as mulheres ocupadas tinham em média 10,2 anos de estudo e os homens, 9,8 anos, mas – mesmo assim – a queda do rendimento médio do trabalho principal foi mais intensa para as mulheres (11,25%) do que para homens (10,42%).
  • Dos 12 milhões de brasileiros desempregados, 6,5 milhões são mulheres. A taxa de desocupação dos homens ficou em 9% no final de 2021, enquanto que a das mulheres foi de 13,9%.

Portanto, já chegou a hora de paramos de discutir entre nós algo improdutivo e partir, juntas, para lutar pela nossa sobrevivência porque é isso, nada mais do que isso, que importa realmente, concorda?

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Ana Horta

Jornalista especializada em arquitetura e decoração e pós-graduada em MKT. Há 12 anos é proprietária da Mão Dupla Comunicação, única agência em Minas especializada em arquitetura,decoração, construção civil e paisagismo. É também uma das idealizadoras do Décor Solidário, projeto social, sem fins lucrativos, que visa revitalizar instituições carentes por meio da decoração.

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