A Voz Delas
Foto: Divulgação

Obrigada, Aline!

“Nenhuma mulher deveria ser xingada, ridicularizada, por algo natural e que, principalmente, nenhuma mulher tem qualquer controle”, Aline Riscado

Por Ana Horta

A essa altura, você certamente já deve ter visto o vídeo da Aline Riscado, referente a sua LIVE, na qual estava praticando Yoga e ficou menstruada e, como estava com uma calça branca, a mancha de sangue logo apareceu.

A partir disso, Aline recebeu muitas mensagens ao vivo de gente rindo dela, debochando e sabe mais o que ela não deve ter lido. Com muita raiva, e com razão, ela desabafou. Abriu as pernas, mostrou o sangue e disse que menstruou sim e que isso é comum, que nenhuma mulher deveria ser xingada, ridicularizada, por algo natural e que, principalmente, nenhuma mulher tem qualquer controle.

Achei de uma coragem incrível dessa mulher.  Atire a primeira pedra quem NUNCA passou por uma situação semelhante. Pode até não ser ao vivo, numa LIVE, como foi da Aline, mas certamente foi na escola, trabalho ou se divertindo com os amigos.

Se é algo tão natural, por que ainda há tanto preconceito? E por que essa discriminação muitas vezes vem da própria mulher? Para tentar responder essas perguntas e explicar o real conceito da menstruação, eu pego emprestado uma linda explanação do coletivo Tecelãs da Lua:

“O sangue menstrual é o único produzido sem feridas, sem guerras e ainda assim é o mais indesejado. O sangrado é um momento muito importante de limpeza da mulher, tanto emocional, como do próprio útero e canal vaginal. O sangue regula o Ph e a flora dos nosso jardim. Ao deixar escorrer livremente, estamos deixando ir todas as preocupações de um ciclo, é um momento de renovação e introspeção. Por que não escutar o próprio corpo e nos dar esses momentos de presente? Parar de cuidar do mundo e cuidar só de uma pessoa: nós mesmas. Ainda temos muito que trabalhar para desmistificar e acreditar a nossa lua, o nosso sagrado que é sim, sagrado”. 

É lindo, é natural e é necessário, sendo assim, então de onde veio esse preconceito? Uma das explicações para isso é religião. Para a Igreja Católica, a mulher era vista como uma reprodutora, dessa forma, o período menstrual era sujo e visto somente como um impedimento para relações sexuais.

Mas, não é só a Igreja Católica que pregava essa “sujeira” da menstruação, o Budismo também. Quando fui para a Tailândia, em um dos Templos que visitei, tinha uma placa dizendo que era “proibida a entrada de mulheres menstruada por serem consideradas impuras”. Eu não estava menstruada, mas não entrei e, desde então, fiquei muitíssima decepcionada com a doutrina.

O fato é que a religião ajudou a propagar algo que os homens nunca entenderam, que ainda é um mistério e que sempre o intrigou já que somente as mulheres conseguem vivenciar. Talvez por isso, associado à religião, que eles criaram a expressão: “Tá de Chico?”.

Ao contrário do que muita gente pensa, Chico não tem haver com o nome Francisco. A palavra vem do português de Portugal onde chico tem como sinônimo porco e é até daí que vem a palavra chiqueiro.

Passaram-se os anos, mas o preconceito persiste. A expressão ainda existe, a vergonha ao enrolar o absorvente de forma bem certinha para o companheiro não veja, ainda é uma realidade, não transar (mesmo querendo) quando está menstruada para não ver a cara de nojo do marido ou namorado persiste e o constrangimento de ficar menstruada, mesmo não tendo nenhum controle sobre isso, e manchar a roupa é algo humilhante.

Ao ter acesso a uma matéria que relatava o que aconteceu com a Aline, eu fui aguerrida (porque atualmente tem que ser mesmo para dar conta) e li os comentários. O primeiro era de uma MULHER que comentou que ela não precisa “arreganhar as pernas” para mostrar a mancha.

Sempre fico muito revoltada contra o machismo de homens, mas de mulheres me ainda mais revoltada. Olhei novamente para ver se realmente se tratava de uma mulher que estava falando isso e, para minha tristeza, era mesmo e ela estava ali replicando uma fala machista para uma situação que, com certeza, já aconteceu com ela e não conseguiu ver a importância daquela ação da Aline que gerou, no mínimo, esse texto.

Mas eu entendo (o que é diferente de aceitar) a postura dela, essa pessoa vive numa sociedade patriarcal, que promove a vergonha de algo natural da mulher que é um ser que já sofre muitos preconceitos. Imersa nesse universo, ela não percebe o quanto está sendo ruim para ela mesma ao deixar aquele comentário.

Por fim, para essa mulher do comentário, todas as mulheres que estão contra a artista e todos os homens machista que acham sujo a menstruação, eu digo que tudo que não é falado, comentado, apontado como natural se torna pesado e uma grande fardo, do qual tanto homens quanto mulheres acabam de alguma forma sendo prejudicado, portanto, obrigada Aline Riscado por nos fazer refletir sobre o assunto!

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Ana Horta

Jornalista especializada em arquitetura e decoração e pós-graduada em MKT. Há 12 anos é proprietária da Mão Dupla Comunicação, única agência em Minas especializada em arquitetura,decoração, construção civil e paisagismo. É também uma das idealizadoras do Décor Solidário, projeto social, sem fins lucrativos, que visa revitalizar instituições carentes por meio da decoração.

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