A Voz Delas

Violência ginecológica

O descaso em atendimentos ginecológicos a mulheres lésbicas e bissexuais.

Por Bárbara Watanabe

Por +Gama

Tenho um relacionamento homoafetivo há quase dois anos e há alguns meses atrás fui a uma consulta ginecológica. Ao se deparar com a informação de que eu tinha relações homossexuais, a doutora que estava me atendendo já mudou sua postura. Perguntou se eu utilizava anticoncepcional e se não consideraria usar os hormônios. Recusei, pois não há necessidade de bombardear meu corpo com esse tipo de medicamento. No exame de prevenção, o papanicolau, o toque foi agressivo e me senti extremamente desconfortável no momento.

Finalizada a consulta, a doutora foi me passar as orientações necessárias para tratar o problema. Quando questionei quais fatores poderiam influenciar para que isso desenvolvesse, ela respondeu um simples: “são as suas relações sexuais”. No momento fiquei pasma. Não tive muita reação além de me levantar, agradecer e sair do consultório.

Chegando em casa, não pensei muito sobre isso. Foi quando algumas semanas depois, comecei a comparar a consulta que tive, com uma que fui no ano passado. Percebi que tinha sofrido algum tipo de violência ginecológica e que a postura daquela médica, ao saber que eu estava em uma relação lésbica, não era normal.

A doutora que me atendeu no ano passado indicou infinitos fatores que poderiam causar o problema. Calça jeans, tecido da calcinha, o que eu como, se estou estressada… e outros milhares. Enquanto a última que fui, só disse que eram minhas relações sexuais. Estranho… não?

Decidi transformar esse assunto em uma pauta e apresentei para a equipe do Gama. Uma das integrantes, lésbica, disse que também já tinha sofrido esse tipo de mau atendimento em consultas ginecológicas por sua orientação sexual. Depois de fazer algumas pesquisas e ler casos relacionados ao assunto, percebi que os médicos não sabem lidar com a homossexualidade e tratam pessoas LGBTQIA+ de forma diferente, pois estão acostumados com a heteronormatividade.

De acordo com o Dossiê Saúde das Mulheres Lésbicas – Promoção da Equidade e da Integralidade (2006), publicado pela Rede Feminista de Saúde, dados mostram essa desigualdade ao acesso de serviços de saúde por mulheres lésbicas e bissexuais. Das mulheres que procuram o atendimento ginecológico, 40% não revelam qual sua orientação sexual. Entre as que revelaram, mais da metade diz que percebeu reações “negativas/ discriminatórias” ou, até mesmo, de “surpresa” por parte dos profissionais. Nesse mesmo grupo, 17% das mulheres afirmaram que os médicos deixaram de solicitar exames ou passar as orientações necessárias.

Depois de passar por uma experiência parecida, a jornalista Larissa Darc lançou o livro: “Vem cá: vamos conversar sobre a saúde sexual de lésbicas e bissexuais”. Questionamentos como “Quais os aparelhos são utilizados para exames ginecológicos para mulheres lésbicas? São as mesmas para todas as mulheres? E os métodos para prevenção de doenças?” inspiraram a jornalista a lançar o livro.

ginecológicos
Foto: Divulgação

Um assunto que também não é muito tratado, mas é de extrema importância, é sobre a prevenção de ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis) em mulheres lésbicas e bissexuais. Não existe muita informação sobre como devemos nos prevenir. Existe a camisinha para pênis e vagina, mas nenhum dispositivo de proteção exclusivo para relações sexuais entre mulheres.

O livro tem a intenção de trazer essa importante discussão à tona e estimular mulheres lésbicas e bissexuais para se atentarem à saúde sexual. Em entrevista para o Ponte, a autora do livro afirma: “Eu espero que esse livro chegue nas pessoas para que elas comecem a pensar nisso e conversar sobre isso. O livro não traz nenhuma resposta definitiva, pois é uma reportagem. Se a gente não estiver pela gente mesmo não vai ser eles que vão estar. Se a gente não pensar em formas de melhorar o atendimento médico, em formas de criar dispositivos de proteção, em formas da gente cuidar da gente mesmo, eu tenho certeza de que não vai ser o governo que vai fazer isso”.

Bárbara Watanabe Oi!! Meu nome é Bárbara Sayuri Watanabe. Sou estudante de jornalismo, estagiária do Portal Gama e fotógrafa (@barbarasayurifotografia). Tenho uma paixão enorme em consumir e criar arte!
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