A Voz Delas
orgasmo

Orgasmo, uma entidade

“Desde muito cedo, a mulher é socializada para não dar vasão aos seus impulsos sexuais, e isso é algo que já se opera desde a antiguidade.”

Por Monalisa Pontes

Por +Gama

O orgasmo feminino é um a entidade, é o encontro do êxtase com todas as potencialidades do sujeito mulher. Lacan fala que a mulher não existe, e isso nos coloca no lugar do indecifrável, do indizível, de um ser sem significante que mostre o real da diferença sexual. Por não termos nosso gozo localizado, visível, palpável fomos chamadas de bruxas e queimadas em fogueiras.

Os dispositivos amorosos nos colocam em prateleiras nas quais ser escolhida é a máxima da nossa existência, nas quais ser desejada por um homem toma estatuto de identidade. O sujeito homem passa por nós e escolhe, a mais doce, a mais magra, a mais bela, a mais subserviente, a que transe sem reclamar, é uma lista infinita, de como ser mulher para o gozo do homem, é tudo referenciado a eles, e isso explica o porquê de fingirmos tanto.

Desde muito cedo, a mulher é socializada para não dar vasão aos seus impulsos sexuais, e isso é algo que já se opera desde a antiguidade. Em meados do século XIX a medicina considerava que mulheres com ardor sexual tinham sérios problemas mentais, e que esses problemas vinham de um excesso do útero, acreditava-se que esse excesso se sobrepunha ao cérebro, ou seja, a razão da mulher, e que isso implicaria em ela não ser uma boa dona de casa. A sexualidade feminina sempre foi atravessada por interesses políticos, econômicos e sociais. Manter a mulher dentro de casa, distante do seu prazer foi e ainda é um dispositivo que favorece a vida social do homem branco burguês lhe conferindo status e poder.

Se antes as mulheres, a partir do movimento das sufragistas, lutavam por direito ao voto, hoje ainda se luta por direitos de sobrevivência, os homens não leem as mulheres, e não somente no sentido literal, os homens não são socializados para exercer amor em relação às mulheres, eles apenas têm a certeza que serão amados, pois essa relação ainda é pautada na lógica capitalista, na qual o corpo feminino é propriedade do homem, que seja o marido, o patrão, os filhos. O direito ao nosso corpo é uma busca cotidiana e constante. Subverter essa lógica é ir de encontro ao gozo não palpável de nossas irmãs bruxas que, ao se permitirem, foram queimadas em fogueiras santas.

A minha prosa é subversiva, é um olhar dentro dos olhos do patriarcado, é cama, mesa e sexo. O orgasmo da mulher é dispositivo de emancipação feminina, é uma potência ante a essa sociedade misógina, gozamos a dois, gozamos sozinhas, podemos ir aonde quisermos, basta um toque e querer flutuar, poder gozar é uma conquista  diária, pois isso implica em se conhecer, se tocar, se olhar nos olhos, o orgasmo diz de se abraçar,  se permitir, de ir muito além do que um ato sexual puro sem reticências, por isso repito a minha máxima; o orgasmo feminino é uma entidade que nos deixa sempre mais próximas de sonhar. É liberdade, emancipação, é ser para além do que reservaram para nós.

Monalisa Pontes Monalisa Pontes
Psicologa Cliníca praticante da Psicanalise Contemporânea decolonial.
Pesquisadora das questões de raça e gênero.
Uma das fundadoras da Clínica Pra Elas, voluntária no Projeto Mulheres Livres, poeta nas horas vagas.
Crp 04/61941
Insta – @monalisapontespsi
Foto

+Gama

Você pode colaborar com a redação do Portal Gama sendo um autor convidado +Gama. Entre em contato pelo e-mail pauta@portalgama.com.br, nos informe sobre o tema que pretende trabalhar e um dos nossos jornalistas entrará em contato para dar sequência ao processo. Obrigado por ser mais uma voz em nossa gama de pensamentos.

COMENTÁRIOS

OUTROS POSTS DO MESMO AUTOR

COLUNISTAS