Crônicas

Sobre ter alopecia areata

Confira a crônica do jornalista e pesquisador Ruleandson sobre ter alopecia areata, doença autoimune que ganhou visibilidade no Oscar de 2022.

Por Ruleandson do Carmo

Por +Gama

Este texto é sobre a (minha) alopecia areata.

Por todas as vezes que deixei de sair, para não ser constrangido com as clássicas perguntas (para nós, pessoas com alopecia areata): “É câncer? É HIV? É tipo peladeira de cachorro? É contagioso?” (Não é! E se fosse, tudo bem, estaria me tratando e deixando os outros em paz, diferentemente de você).

Por quando me escondo, para não ouvir: “por que você está de boné?” ou, após tirarem o meu boné, “desculpa, queria só ver”. Por todos os encontros amorosos nos quais se levantaram e me deixaram: “parece um paciente terminal, não consigo”, “lembrei de propaganda de gente com câncer, fiquei abalado, minha mãe teve. Tchau”.

Por sempre que (pessoas com cabelos lindos, como todos) dizem: “é só cabelo!”, “é uma oportunidade, você pode usar chapéus, lenços, perucas lindas”. Sério, gata? Por que você não raspa o seu cabelo, sobrancelhas e cílios e vive a oportunidade única que acha confortável para eu viver?

Quando me obrigam a ouvir “mas você fez algo ruim, Deus sempre cobra”, como se doenças fossem punições divinas. Onde estava seu Deus quando não te impediu de nascer?

Por sempre que quis quebrar todos espelhos e superfícies refletoras e me tornar invisível ao sair, não por me sentir feio,  mas para esquecer que estou doente.

É também para agradecer a todas as pessoas que conseguem me encontrar, me ver, sem falar sobre minha doença, apesar de ser tão visível. Para agradecer a Jada Pinkett, corajoso exemplo da beleza/força nossa, pessoas com alopecia areata, por nos permitir hoje ter uma explicação mais leve e empoderada (quase fofoca): “tenho a mesma doença da Jada Pinkett”.

É porque não é só a capacidade escrota de fazer piada sobre alopecia areata que abala. A capacidade de algumas pessoas de, novamente, invisibilizar, menosprezar e tornar sem importância a NOSSA dor e a NOSSA doença também é escrota.

Com quantas pessoas com areata você se solidariza? Quantas informações sobre alopecia você compartilha? Quantas histórias de dor de quem tem a doença você acolhe? Ou apenas invisibilizou a alopecia areata e a fez de trampolim para falar de si?

A alopecia areata existe, a nossa dor também. Respeite!

Ruleandson do Carmo Ruleandson do Carmo – Jornalista (TV UFMG – Cedecom) atuante há 15 anos com jornalismo audiovisual científico. Pesquisador científico do campo da comunicação e informação (Epic UFMG) investigador de sujeitos informacionais de redes sociais, afetos, preconceitos e audiovisual. Ativista em prol dos direitos humanos, em especial, em prol da questão LGBT+. Bacharel em jornalismo (UniBH), especialista em criação e produção para rádio e TV (UniBH), mestre e doutor em Ciência da Informação (UFMG), com residência pós-doutoral concluída (UFMG).
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