Política
Arte: Michelle MKO

Bolsonaro é inaceitável

A negligência em relação às medidas de isolamento social e prevenção da infecção foram em parte atribuídas à retórica de Bolsonaro que insistia na afirmação de que “O Brasil não pode parar”.

Por Ana Cristina Simões e Silva

Por +Gama

Refleti bastante e resolvi que deveria escrever algo a respeito das eleições presidenciais. Definitivamente, não sou uma pessoa ligada à política e, muito menos, uma ativista. Mas sou uma cientista! Sou professora titular da Faculdade de Medicina da UFMG. E, considerando meu cargo e minha função social, tenho de expressar publicamente minha análise dos fatos.

A pandemia de doença do coronavírus de 2019 (COVID-19) foi, muito eufemisticamente, a reedição moderna da peste negra. Por ser uma doença bastante contagiosa, milhares de pessoas se infectaram ao redor do mundo e diversas delas faleceram em decorrência da doença.

Nesse contexto, apresento dados que mostram como o Presidente Jair Bolsonaro atrapalhou muito os programas de enfretamento à pandemia de COVD-19 e de vacinação contra doença.

Arte: Michelle MKO

Quando a infecção pelo SARS-CoV-2 começou a se espalhar pelo Brasil atingindo em abril de 2020 mais de 200 milhões de pessoas, o Presidente Bolsonaro chamou a COVID-19 de ‘gripezinha’ e pediu que os brasileiros ‘enfrentassem o vírus como homens e não como moleques”. Tal postura inaceitável e sem qualquer respaldo científico resultou em divergências com o então Ministro da Saúde,  Luiz Henrique Mandetta, que culminaram mais tarde em sua saída do cargo. Em abril de 2020, o tradicional jornal Norte-Americano The Washington Post publicou um editorial cujo título era: “Líderes arriscam vidas minimizando o coronavírus. Bolsonaro é o pior deles.”

Isso foi apenas o começo de uma condução desastrosa do Brasil durante a pandemia. Muito mais estava por vir. Rapidamente nosso país ocupou e se manteve na primeira posição em número de infectados e de mortos pela COVID-19. A negligência em relação às medidas de isolamento social e prevenção da infecção foram em parte atribuídas à retórica de Bolsonaro que insistia na afirmação de que  “O Brasil não pode parar”.

Bolsonaro inaceitável
Arte: Michelle MKO

Em janeiro de 2021, a população de Manaus se desesperou com a falta de oxigênio nos hospitais em meio a uma onda ainda mais violenta e mortal de infecções pelo SARS-CoV-2.  Foi realizada uma pesquisa denominada de Covid Performance Index pelo Instituto Lowy, localizado na Austrália. O levantamento avaliou as respostas à pandemia em relação aos impactos geográficos, políticos, populacionais e econômicos na evolução das infecções por SARS-CoV-2. Para isso, foram analisados dados de casos confirmados da doença, número de mortes, total de casos e mortes em relação ao tamanho da população, bem como proporção de testes realizados e de casos confirmados nesses testes. O Brasil ficou em último lugar no ranking, revelando-se como o pior país no controle da pandemia. O governo federal brasileiro não adotou políticas competentes e com base na ciência, não houve uma política de defesa de isolamento social nem de testagem da população e as fronteiras permaneceram, a maior parte do tempo, abertas. Tais ações equivocadas deixaram o vírus livre para continuar a infectar e matar milhares, enquanto a vida dos brasileiros se manteve muito longe da normalidade e a economia não apresentava quaisquer perspectivas de recuperação.

Como se não bastassem todos essas tragédias, houve um atraso muito grande no início da vacinação contra COVID-19 no Brasil. Além do atraso injustificável para a importação dos imunizantes, o Presidente Bolsonaro fez afirmações absurdas, irresponsáveis e que agridem qualquer pessoa que pauta suas decisões em evidências científicas. Seguem dois trágicos exemplos de afirmações absurdas do líder da nação: “A pressa da vacina não se justifica porque você mexe com a vida das pessoas, você vai inocular algo em você”. “Se você virar um jacaré, problema de você. Se você virar super-homem, se nascer barba em alguma mulher aí ou algum homem começar a falar fino, eles não vão ter nada a ver com isso. O que é pior: mexer no sistema imunológico das pessoas. Como é que você pode obrigar alguém a tomar uma vacina que não se completou a 3ª fase ainda, que está na experimental?”

Arte: Michelle MKO

Em relação a segunda afirmação de Presidente Bolsonaro, cabe ressaltar que diversos imunizantes já haviam realizado estudos de fase 3 extremamente criteriosos e muito bem desenhados do ponto de vista metodológico. Se hoje estamos numa fase de estabilidade em relação à pandemia, isso se deve à eficiência do Programa Nacional de Imunização (PNI) do Sistema Único de Saúde de nosso país. Contrariando os posicionamentos e afirmações irresponsáveis e descabidas do líder da nação, o PNI agiu com a máxima eficiência no sentido de atingir  ótima cobertura vacinal da população  brasileira.

Os argumentos para não votar em Jair Bolsonaro ainda são inúmeros, mas, ser considerado internacionalmente e por meio de parâmetros objetivos o pior líder mundial no enfrentamento da maior crise sanitária do planeta, me parece algo absolutamente convincente e contundente.

Ana Cristina Simões e Silva

Ana Cristina Simões e Silva

Professora Titular do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Pesquisadora do CNPq.

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