Turismo

Explorando a África

No terceiro texto sobre a Cidade do Cabo, um pouco de história

Por Júnia Leticia

Como disse no último texto Estreia na áfrica (se não viu, clique aqui), a dispensa do host onde estava do pessoal com o qual faria o safari, fiquei meio perdida sem saber o que fazer. Afinal, não entendi o motivo pelo qual ele mandou o pessoal embora. Só sei que, a partir daí, revoltada, decidi que só ia falar inglês na sala de aula e que procuraria conversar somente com pessoas que falassem português.

Então, entrei em contato por telefone com o Daniel, moçambicano que estava fazendo curso de inglês na mesma escola que eu, e ele me disse que poderíamos ir à Robben Island, onde ficou preso Nelson Mandela (1918-2013), líder do Congresso Nacional Africano (CNA), principal organização política de representação dos negros e de combate ao apartheid, política de segregação racial implantada em 1948 na África do Sul..

Chegamos à ilha de barco e, logo depois, pegamos um ônibus, que tinha como guia um ex-prisioneiro. A visita foi indescritível. Como afrodescendente, na adolescência, eu já havia participado de festivais de cultura negra e, em um deles, ganhei uma revista com histórias de resistência do povo africano. Mesmo conhecendo a luta de Mandela, nada se compara a estar naquele lugar, que além da prisão, abrigava casas das pessoas que nela trabalhavam.

A visita à prisão onde ficou Mandela foi guiada por um ex-detento.

Depois de percorrer a ilha, vendo aquelas casas simples, porém, com suas belezas bucólicas, chegamos à prisão. O mais impressionante ao percorrê-la foi conhecer a cela onde Mandela passou 18 de seus 27 anos de detenção. Não dava para imaginar como ele, com seus 1,85m de altura, ficou quase duas décadas em um local que tinha 4 metros quadrados!

Mas ele resistiu e, libertado em 11 de fevereiro de 1990, Madiba, como também era conhecido por fazer referência ao seu clã, se tornou, em 1994, o primeiro presidente eleito da África do Sul, cargo que ocupou até 1999. Ao se eleger e durante sua permanência na África do Sul, ele buscou a reconciliação com seus algozes em prol da paz entre negros e brancos no país. Acima de qualquer sentimento de vingança, e era comprometido com o bem estar de seu povo.

Mas havia muito mais a explorar na Cidade do Cabo e um desses pontos era a Table Mountain, principal cartão postal da Cidade do Cabo e uma das sete maravilhas naturais do mundo. A visitei em uma atividade da escola, com dezenas de estudantes. E eu juro que quando recebi o convite entendi que levaria uns 40 minutos até chegar ao cume. E lá fui eu, inocentemente, levando duas barrinhas de cereal na mochila.

Table Mountain vista da Robben Island

A trilha que leva ao topo da Table Mountain, que supera os mil metros de altitude, alto dessa imensa montanha de cume achatado que é bem íngreme e, diferente do que pensei, demorou duas horas! Mas a recompensa é obtida a cada passo, já que a paisagem é deslumbrante.

Seu ponto mais alto supera os mil metros de altura. Dessa imensa montanha de cume achatado que se estende por três quilômetros ao redor da TableBay, a formosa baía da cidade, dá para ver toda a cidade a Cidade do Cabo e a imensidão azul do Oceano Atlântico, com suas praias de areias brancas.

A vista do alto da Table Mountain é fantástica

Morrendo de fome, minha sorte é que havia um restaurante no alto da montanha! Aí, toda entusiasmada, ataquei uma coxa de frango, percebi que era doce. Ainda não me acostumei com carne doce e feijão doce. Este último não tive nem coragem de experimentar. Lá também havia uma grande variedade de produtos para vender. Depois de comer, descemos pegamos o teleférico que demorou cinco minutos para descer a Table Mountain.

Mas ainda havia mais o que fazer antes do fim de semana. Os angolanos me convidaram para ir a uma festa brasileira. O moçambicano também foi. Fiquei intrigada com a proposta. Queria saber que evento era esse que conseguia sintetizar em uma só as festas que ocorrem em todo Brasil.

Chegando lá, vi que era uma muvuca. Mal dava para me movimentar. E tinha de tudo, mas o que predominava era o samba, claro, além das camisas da seleção brasileira. Arrumei um lugar para ficar e comecei a conversar com meus colegas de idioma. Mas achei algo estranho: apesar de estarem no mesmo continente e falarem o mesmo idioma, os angolanos ficavam de um lado e o moçambicano de outro. Fui ao banheiro, voltei e, pouco depois, fui embora, nem me lembro com quem.

Na mesma semana, um dos angolanos me chamou para jantar e eu fui. E pela enésima vez ele me perguntou: por que você é solteira? Quando pretende se casar? Quantos filhos quer ter? Aí, já nervosa, falei: “ninguém fica me perguntando isso no meu país não. Lá, é falta de educação.” E, com raiva, perguntei a ele quantos filhos tinha, ao que ele me respondeu: 11. E olha que ele tinha 41 anos.Depois de pesquisar, descobri que a poligamia é legalizada em Angola.

Bom no dia seguinte, encontrei o moçambicano no refeitório. Aliás, ele tinha uma história de vida muito interessante. Devido à guerra naquele país (1977-1992), ele teve que fugir para não ser, literalmente, forçado a ir para guerra ainda adolescente. Como refugiado, ele viveu eu países como Holanda e Cuba, o que o tornou um poliglota.

Enquanto almoçávamos, ele disse que me viu no restaurante com o angolano e eu, ingenuamente, perguntei porque ele não foi me cumprimentar. Aí ele disse que, no dia da festa brasileira, quando eu fui ao banheiro, o grupo de angolanos falou com ele que era para se afastar de mim porque eu já tinha dono. Oi?E foi assim que as relações diplomáticas entre Brasil (eu) e Angola terminaram.

Contive a raiva e foquei nos passeios. Afinal, ainda havia muito a ser explorado.

Semana que vem tem mais.

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Júnia Leticia

Jornalista pós-graduada em Comunicação Empresarial, redigiu matérias para veículos diversos, como os jornais O Tempo e Estado de Minas. Os textos publicados neste último veículo lhe conferiram o Prêmio Abracopel de Jornalismo, da Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos a Eletricidade (edições de 2010 e 2012) e troféu referente ao Prêmio Abecip de Jornalismo (2011), conferido pela Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança. Também possui experiência em assessorias de comunicação, como da Fundação de Ensino de Contagem (Funec), Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH), Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro-MG), Conselho Regional de Enfermagem de Minas Gerais (Coren-MG) e Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH).

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