Turismo

Voluntariado na África

Samara Ribeiro relata a experiência de ser voluntária na África do Sul

Por Samara Ribeiro

Eu sempre tive vontade de ser voluntária na África do Sul, queria me envolver com a cultura africana, conhecer os seus animais tão especiais e ajudar da melhor forma possível. Então, em 2019, em meio a uma depressão que me atingia desde o ano anterior, eu fiz minha mochila típica de mochileiro e fui. Peguei férias no trabalho, contratei uma agência especializada em trabalho voluntário no mundo e me joguei. Sozinha, pois se é difícil achar alguém pra viajar para a Europa, imagina para trabalhar na África. hahaha (risos de nervoso).

Escolhi uma ONG que cuida de animais selvagens africanos, especialmente Guepardos. Eu amo felinos, identifico-me com a independência deles. A ONG fica no interior do estado de Gauteng, são quase 3 horas de distância da querida Joanesburgo, mas antes de ir pra lá eu passei alguns dias na Cidade do Cabo. Que lugar! A Europa da África, carros de luxo parados nos sinais vermelhos, prédios magníficos, restaurantes de luxo, cidade linda… Cidade branca.

Eu adoro história e sempre gostei de estudar os acontecimentos mundiais, como o Apartheid. Um dos motivos por querer passar um tempo na Cidade do Cabo era para visitar a Robben island, prisão onde Nelson Mandela passou mais de 20 anos de sua vida.

Meus primeiros dias na Cidade do Cabo já começaram a me atingir duramente, me incomodava muito ver que os negros ainda serviam aquele lugar. Não me lembro de ver nenhuma família negra passeando ou consumindo nos restaurantes que frequentei, eles estavam servindo as mesas das pessoas brancas. No dia que visitei a Robben island chorei até dormir, o guia turístico era um ex-prisioneiro do local e contava suas próprias histórias vivendo na ilha. Repreendi duas mulheres que estavam tirando selfie sorrindo enquanto ele segurava um cobertor super fino e contava como sobreviveu às noites frias de inverno.

Ex-prisioneiro de Robben Island. – Foto: Arquivo pessoal

Eu já imaginava o que me aguardava em Joanesburgo, pesquisei muito sobre a cidade antes de ir, pois me alertaram que era uma das cidades mais perigosas para uma mulher viajar sozinha. Eu não vi o perigo em si, mas vi muita desigualdade. Ao contrário da Cidade do Cabo, Joanesburgo é composta por cerca de 80% de negros. Você consegue identificar, com muita facilidade, um bairro branco, pois está sempre cercado por seguranças e casas maravilhosas, por outro lado, temos a favela do Soweto, um museu vivo da segregação racial.

África do Sul
Segregação racial. – Foto: Arquivo pessoal

Cuidar dos animais foi a parte mais fácil. A Savana tem um silêncio que grita e eu fazia questão de ouvir. Optava por não pegar a carona no Jipe (Que passava toda manhã para pegar os voluntários e levar ao centro da ONG) e ir andando só para ouvir o silêncio da savana e encontrar com Girafas curiosas e Gnus apressados. Sem sinal de celular, sem computador, sem comunicação. A Puma Maya era uma excelente companhia, a felina, mesmo cega dos dois olhos, parecia que me enxergava.

Foto: Arquivo pessoal

Fiquei doente, todos os 6 voluntários que estavam comigo na casa ficaram. Aparentemente era a água do poço que bebíamos, então, parei de beber água e desidratei. Era uma escolha difícil, ou eu bebia a água e ficava doente ou não bebia e ficava desidratada. Não tinha muito o que fazer. A coisa ficou tão feia para os outros voluntários que, por segurança, me tiraram da casa e me isolaram em outra casa na savana sozinha, uma casa bem mais distante do centro da ONG, não tinha como eu ir andando até lá, como costumava ir da outra casa. Sem comunicação nenhuma o jeito era torcer todas as manhãs para não me esquecerem por lá.

Um dia faltou frango. Não tinha como alimentar os animais. O freezer havia quebrado e tudo dentro dele estragou e não havia dinheiro para comprar. A fundadora da ONG pegou o que tinha de carne na casa dela e preparamos a comida do dia só para as fêmeas que estavam grávidas ou tinham acabado de parir. Foi de partir o coração, dezenas de animais passaram quase dois dias sem comer e eu mais uma vez chorei até dormir. Eu aprendi tanto nessa viagem sobre empatia, sobre ser um Ser Humano, sobre proteger a natureza e os animais e, apesar de ter sido a viagem mais difícil que já fiz até hoje, eu voltaria e faria tudo novamente.

Como eu disse no início desse texto, quando visitei a África do Sul, eu passava por um momento muito difícil na minha vida pessoal e fui na intenção de ajudar da melhor forma possível, mas acabei sendo ajudada.

Foto

Samara Ribeiro

Jornalista e pós-graduada em Marketing. Há mais de 10 anos trabalho no mercado financeiro. Paulistana amante do mundo, já visitei mais de 15 países.

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